domingo, 25 de novembro de 2012

A coisa está preta


A boa dose de ironia colocada no título deste post mostra a fragilidade da nossa suposta democracia racial. Para fazer jus à lógica do ditado popular, a sequência deste artigo deveria então reportar exemplos negativos. O texto, porém, frustrará as expectativas. Felizmente. Esta semana a questão racial ecoou nos meios de comunicação por razões diversas, e sem qualquer correlação entre si. O que tem de relativamente novo (e digno de registro) neste debate da questão racial é o fato de todas notícias serem positivas.

Vamos começar pela menos importante, contrariando as regras do bom jornalismo que ensina a publicar a informação mais importante o lead. O comércio brasileiro de uns três anos para cá começou a importar mais um modismo tipicamente norte-americano. Refiro-me à Black Friday (sexta-feira negra), promoção onde os já endividados sobrinhos do Tio Sam dormem na porta de grandes magazines para aproveitar os mega-descontos e se enforcarem um pouquinho mais na hora de pagar a fatura do cartão de crédito.

A galera brasileira que adora uma moda estrangeira não perdeu a oportunidade de copiar o bagulho. O que não sabem muito bem é a tradução literal do termo. “Se os preços são tão bons, por que eles chamam de back?”, indagou uma consumidora desavisada.

Lá nos states, quando o assunto é grana, o black significa ter o saldo da conta corrente positivo – o correspondente internacional ao nosso azul. Daí o nome da promoção, que não faz muito sentido por aqui porque a associação a expressões como preto e negro costuma nos remeter a termos negativos.

Passando do noticiário econômico para as páginas de cultura, a negritude continuou a estampar as manchetes. Desta feita dando destaque ao festival black2black, realizado no Rio de Janeiro. No evento, artistas do Brasil e da África se juntam para exaltar a negritude e falar da questão racial no mundo.

A primeira edição ocorreu em 2009 e de lá para cá o evento vem ganhando prestígio. Este ano, representantes de oito países africanos confirmaram presença no festival, que tem como marca a crítica social. Por isso, além da música, o black2black promove uma série de debates.

Embora este seja o queridinho da mídia no momento, é cada vez mais comum encontrar eventos culturais com propostas semelhantes. É torcer para que os idealizadores não se deixem seduzir pelo canto da sereia – ou melhor, dos patrocinadores – e transformem tudo em apenas mais um grande show business.

O assunto da semana, no entanto, foi sem dúvida a posse do ministro Joaquim Barbosa no comando Supremo Tribunal Federal (STF). A cerimônia cheia de pompa começou a quebrar o protocolo já na lista de presença. Artistas, autoridades, políticos e militantes dos movimentos sociais foram prestigiá-lo numa manifestação de apoio e popularidade sem precedentes na Corte.

Tudo lindo e muito emocionante. Mas, um aspecto precisa ser sublinhado: Joaquim Barbosa, que chegou ao STF em 2003, não alcançou a presidência da mais alta instância do Poder Judiciário brasileiro por ser negro. Sua ascensão profissional é consequência de sua competência e currículo invejáveis. Quaisquer referências à cor da pele do ministro sem citação à competência técnica soa como puro preconceito.

Oriundo de uma família pobre, Joaquim Barbosa é prova viva de que o melhor caminho para o país alcançar a tão almejada justiça social é possibilitando educação de qualidade para todos os cidadãos. Que sirva de lição!

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